ESTADO DE GOIÁS - PODER JUDICIÁRIO
COMARCA DE ARAGARÇAS
2ª VARA JUDICIAL
SENTENÇA
Natureza: PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Processo de Conhecimento -> Procedimento de Conhecimento -> Procedimentos Especiais -> Procedimentos Regidos por Outros Códigos, Leis Esparsas e Regimentos -> Ação Civil de Improbidade Administrativa
Processo n.: 5692684-33.2023.8.09.0014
Requerente: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS
Requerido (a): NOSLEN DA SILVA MORAES
Trata-se, nos presentes autos, de ação civil pública por ato de improbidade administrativa ajuizada pelo Ministério Público do Estado de Goiás em desfavor de Noslen da Silva Moraes, Marcos Rodrigues da Costa e Cairo Cavalcante, todos devidamente qualificados.
Em síntese, a inicial sustenta que a conduta dos requeridos violou os princípios previstos expressamente no caput e inciso I do artigo 11, da Lei 8.429/92, quais sejam, os da honestidade, imparcialidade e legalidade, além dos preconizados pela Constituição da República, no artigo 37, caput - à guisa de exemplo, os da impessoalidade, moralidade e eficiência, ao praticarem ato visando fim proibido em lei.
Contestações apresentadas nos eventos 15 e 17 pelos requeridos Noslen da Silva Moraes e Marcos Rodrigues Costa, nas quais sustentam a ausência de provas.
Citado, o réu Cairo Carvalho de Resende deixou transcorrer o prazo para contestar a ação.
Intimado para impugnar as contestações, o Ministério Público do Estado de Goiás manifesta pela improcedência da ação, pela revogação do inciso I do art. 11 da Lei 8.429/92 (evento 23).
Vieram-me os autos conclusos.
É o relatório. Fundamento e decido.
De proêmio, verifica-se que o art. 17, § 10-C, inserido pela Lei 14.230/21, passou a vedar ao juízo, por ocasião da prolação de sentença, a modificação da capitulação jurídica ofertada pelo autor.
De outra parte, dispõe o § 11 do mesmo art. 17 que, “em qualquer momento do processo, verificada a inexistência do ato de improbidade, o juiz julgará a demanda improcedente”.
Pois bem, como é cediço, a condenação nas sanções por ato de improbidade administrativa exige provas do elemento subjetivo, consolidado no dolo ou vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito, não bastando, portanto, a voluntariedade do agente, conforme art. 1º, §1º da Lei n.º 8.429/92, vejamos:
“Art. 1º O sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa tutelará a probidade na organização do Estado e no exercício de suas funções, como forma de assegurar a integridade do patrimônio público e social, nos termos desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)
Parágrafo único. (Revogado). (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)
§ 1º Consideram-se atos de improbidade administrativa as condutas dolosas tipificadas nos arts. 9º, 10 e 11 desta Lei, ressalvados tipos previstos em leis especiais. (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021)”
Assim, com a nova alteração legislativa, a condenação por ato de improbidade não mais admite o dolo genérico. Há que se indagar acerca do dolo específico do agente, para demonstrar o agir desonesto, a intenção malévola, a burla à legislação com o fim específico de cometer o ato ímprobo, sob pena de improcedência.
Nesse contexto, a nova Lei de Improbidade Administrativa, em virtude da sua natureza jurídica sancionatória, aplica-se de forma retroativa ao caso em tela, por ser mais benéfica, isso porque a partir de agora só há ato de improbidade nas condutas dolosas específicas, bem como nas hipóteses alinhadas nos incisos dos arts. 10 e 11, da Lei n.º 8.429/92, cujo rol passou a ser taxativo.
Antes das mudanças trazidas pela Lei nº 14.230/2021, a redação art. 11 permitia tanto a condenação “genérica” pela violação de princípios da Administração Pública (prevista no caput) quanto a condenação em condutas específicas, sendo uma delas “retardar ou deixar de praticar, indevidamente ato de ofício” (inciso II). O rol previsto, portanto, era meramente exemplificativo.
Após a vigência da Lei nº 14.230/2021, o caput do art. 11 foi modificado, passando a prever um rol taxativo de atos ímprobos atentatórios dos princípios da Administração Pública, de tal forma que algumas das condutas previstas (inciso I) foram revogadas. A nova redação do artigo 11, alterado pela Lei n° 14.230/2021 dispõe que:
“Art.
11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os
princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole
os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade,
caracterizada por uma das seguintes condutas: (Redação dada pela Lei nº
14.230, de 2021)
I - (revogado); (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)”
Assim, não mais existe inciso correspondente ao anterior inciso II, o qual foi revogado, de modo que tal conduta na presente demanda não mais configura ato de improbidade administrativa, ante a ausência de previsão legal.
Aliás,
esse é o entendimento do egrégio Tribunal de Justiça de Goiás, que em
situação semelhante, decidiu pela retroatividade da norma material mais
benéfica diante da revogação dos incisos I e II do art. 11 da Lei n.º
8.249/1992, aplicando a Lei n. 14.230/2021 aos casos em curso. Vejamos:
“(…) AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. (…) CONDUTA ÍMPROBA. RETROATIVIDADE DA NORMA MATERIAL MAIS BENÉFICA. ABOLITIO ILLICIT. REVOGAÇÃO DOS INCISOS I E II DO ARTIGO 11 . sistema da Improbidade Administrativa adota os princípios do Direito Administrativo Sancionador, de modo que a Lei n. 14.230/2021 aplica-se retroativamente aos casos em curso. Destarte considerando que foram revogados os incisos I e II do art. 11 daLei n. 8.249/1992, a norma benéfica deve retroagir, trazendo por consequência, abolitio illicit, de modo que o recorrente não pode ser condenado pela prática das referidas condutas.” (TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO - Recursos - Apelação Cível 5287049- 29.2018.8.09.0074, Rel. Des(a). DESEMBARGADORA SANDRA REGINA TEODORO REIS, 6ª Câmara Cível, julgado em 11/02/2022, DJe de 11/02/2022). (Grifei)
Portanto, deve o pedido inicial ser julgado improcedente.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, com fundamento no artigo 487, I, do Código de Processo Civil, JULGO IMPROCEDENTE o pedido formulado na inicial e, por conseguinte, JULGO EXTINTO o feito com resolução do mérito.
Sem custas e honorários advocatícios nos termos do art. 23-B, caput e §2º da Lei 8.429/1992.
Interposta apelação, INTIME-SE a parte adversa para contra-arrazoá-la, encaminhando-se os autos em seguida ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Goiás.
Após o trânsito em julgado, CERTIFIQUE-SE e ARQUIVEM-SE os autos com as baixas e anotações necessárias.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Expeça-se o necessário. Cumpra-se.
Aragarças, datado e assinado digitalmente.
Leonardo Lopes dos Santos Bordini
Juiz de Direito Respondente
(assinado digitalmente)